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O presente artigo examina os dispositivos legais introduzidos pela Lei nº 13.445/2017 — Lei de Migração — que inseriram os artigos 337-A a 337-D no Código Penal, estabelecendo os crimes contra a soberania nacional, especialmente aqueles relacionados à entrada e permanência irregular de estrangeiros em território brasileiro.
O conjunto dos artigos 337-A a 337-D do Código Penal busca proteger a soberania nacional e a segurança do Estado brasileiro frente a ações que envolvem a entrada, permanência e saída irregular de estrangeiros. Esses tipos penais foram inseridos em um contexto global de intensificação das migrações internacionais, reforçando o papel do Estado como garantidor da ordem interna e da integridade de suas fronteiras.
A soberania nacional, entendida como o poder supremo do Estado dentro de seu território e sua independência perante outros Estados, é o bem jurídico central tutelado nesses dispositivos. A infração a essa soberania ocorre quando se busca, por meios ilícitos, permitir o ingresso ou a evasão de pessoas em desconformidade com as normas de migração, o que compromete o controle estatal e a segurança pública.
Artigo 337-A: Promoção da Entrada Ilegal de Estrangeiro
O artigo 337-A tipifica a conduta de “promover, intermediar ou auxiliar a entrada ilegal de estrangeiro em território nacional”. O verbo “promover” abrange tanto ações diretas, como transporte e orientação de rotas, quanto indiretas, como fornecimento de documentos falsos. A pena prevista busca coibir o tráfico de pessoas e o favorecimento à imigração irregular.
Esse tipo penal possui caráter preventivo e visa desestimular a formação de redes ilícitas que atuam na travessia clandestina de fronteiras. A participação de organizações criminosas é comum nesses casos, o que pode atrair a aplicação de agravantes específicas, conforme a Lei nº 12.850/2013.
Artigo 337-B: Facilitação da Saída Irregular de Estrangeiro
Diferentemente do artigo anterior, o 337-B volta-se à conduta de “facilitar a saída de estrangeiro não autorizado em situação irregular no território nacional”. Trata-se de proteção complementar à soberania, uma vez que o Estado também tem o direito de controlar a saída de pessoas que estejam sob sua jurisdição. A finalidade é evitar evasões de indivíduos envolvidos em ilícitos administrativos ou criminais.
Assim, a norma penal não apenas protege o território, mas também o cumprimento de medidas legais e administrativas, como deportações, expulsões e processos de regularização migratória. O agente ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive nacionais ou servidores públicos.
Artigo 337-C: Angariação de Fundos para Ações Clandestinas
O artigo 337-C amplia o alcance repressivo ao punir quem “angariar fundos, investimentos ou recursos de qualquer natureza com a finalidade de promover a entrada, saída ou permanência clandestina de estrangeiro”. Aqui o foco é econômico: o legislador busca coibir o financiamento de redes ilegais que exploram financeiramente a vulnerabilidade de migrantes.
- Conduta típica: obtenção ou repasse de recursos para facilitar práticas ilícitas de migração;
- Elemento subjetivo: dolo específico, ou seja, a intenção de fomentar ou apoiar ações clandestinas;
- Bem jurídico protegido: soberania e segurança das fronteiras nacionais.
“A soberania de um Estado se expressa, em primeiro lugar, na capacidade de decidir quem entra e quem sai de seu território.”
— Hans Kelsen, Teoria Pura do Direito
Artigo 337-D: Falsa Identidade e Dano a Terceiros
O artigo 337-D trata da atribuição de falsa identidade, própria ou de terceiros, com o propósito de obter vantagem ou causar dano. Ainda que pareça deslocado do tema migratório, sua inclusão nessa seção visa contemplar o uso de identidades falsas em processos de imigração, refúgio ou obtenção de documentos oficiais.
A conduta lesa não apenas a fé pública, mas também a soberania, pois corrompe os mecanismos estatais de identificação e controle civil. A pena aplicável é cumulável com outras sanções administrativas, podendo ser agravada em casos de falsificação documental ou uso em organizações criminosas transnacionais.
Considerações Finais
Os artigos 337-A a 337-D revelam uma modernização do Direito Penal brasileiro diante dos desafios contemporâneos da globalização. A migração, embora seja um fenômeno natural da humanidade, requer equilíbrio entre o respeito aos direitos humanos e a preservação da soberania estatal.
Tais dispositivos não visam criminalizar o migrante, mas sim punir os intermediários que lucram com sua vulnerabilidade, ou aqueles que atentam contra o controle legítimo das fronteiras nacionais. O Estado, por meio dessas normas, reafirma sua autoridade sobre o território e sobre a movimentação de pessoas que nele ingressam ou dele saem.
Autor: Redação Informando Melhor — especialista em legislação penal e segurança pública. Este conteúdo integra a série "Lei e Sociedade", que analisa os impactos das normas jurídicas no contexto nacional e internacional sob a ótica da soberania e da proteção do Estado.
